Versão Digital - A teoria do primata aquático e a natação para bebês


Versão impressa original em: Bainbridge J. Homem: Um passado aquático. Nadar Rev Bras Esp Aquat 1996; 100:22-24


Adaptações aquáticas humanas (parcial)

Figura. Adaptações aquáticas humanas (imagem parcial adicionada pelo editor de NADAR! SWIMMING MAGAZINE, não faz parte da versão original) (1)


A teoria do primata aquático e a natação para bebês

John Bainbridge*

* John Bainbridge, técnico australiano, especialista em natação para bebês

Palavras-chave: homus-aquaticus, natação para bebês, evolução humana, adaptação à água

https://n2t.net/ark:/21207/NADAR.v1i164.8

RESUMO

Atividades aquáticas infantis e pré-escolares tem sido parte da vida desde que o homem iniciou sua associação a água. Já foi sugerido por alguns escritores de antropologia e evolução (2-4); que o homem possa ter tido um passado aquático. Já foi postulado que estes 3 a 5 milhões de anos adaptando-se à água tenham nos impulsionado a frente dos demais primatas no processo da evolução humana.

INTRODUÇÃO

Durante o período de 3 a 10 milhões de anos atrás, o continente africano estava sob uma severa seca. Esta seca durou por alguns milhões de anos e muitas espécies se perderam e outras novas foram formadas. O norte da África foi engolido pelo mar, exceto algumas áreas elevadas que formaram ilhas.

A Teoria do Primata Aquático (Figura) versa que durante este período (de 3 a 10 milhões de anos atrás) um grupo de primatas embarcou num rumo diferente de evolução por adaptar-se ao ambiente aquático, assim como ocorreu anteriormente com outros mamíferos (baleias, golfinhos, focas, etc.). O meio ambiente encorajou esta espécie a buscar alimentos nas águas quentes por uma questão de sobrevivência. Quando as águas baixaram, as áreas rasas drenaram e as ilhas novamente integraram o continente. Este grupo de primatas entrou no mundo trazendo uma bagagem que alteraria o futuro do desenvolvimento da espécie humana.

O HOMUS AQUATlCUS

Esta teoria sugere que o homem perdeu os pelos e desenvolveu uma camada de gordura subcutânea pelo mesmo motivo que também os fizeram a baleia, o golfinho e o leão marinho: pois se qualquer mamífero de razoável tamanho tem a necessidade de manter-se aquecido, este estará melhor servido por uma camada interna de gordura que com uma camada externa de pelos.

Bipedalismo (caminhar sobre dois pés) pode ser 'explicado pela teoria aquática'. Jones, Hardy e Morgan (2,4,5) imaginam um primata que entrava em águas cada vez mais profundas em busca de comida e que esticava-se sobre duas pernas para manter a cabeça acima da água para respirar. Com o passar do tempo estes aprenderam a nadar e a mergulhar. Uma postura mais vertical ajudaria nesta tarefa e gradualmente a região pélvica inclinou-se a frente e a coluna vertebral alinhou-se verticalmente. Morgan (5) escreveu:

'o homem é o único mamífero cujo principal meio de locomoção é caminhar sobre duas pernas. Um padrão de comportamento que aparece de forma tão singular em toda a história da evolução da vida na terra necessita de grande dose de explicaçãol'.

Talvez o desdobramento mais interessante desta teoria seja a habilidade do homem em nadar e mergulhar. Foi esta habilidade do homem que me levou a expandir a teoria do primata aquático neste trabalho. O homem nasce com um reflexo de nadar e mergulhar que começa a diminuir a partir do nascimento, porém que pode ser retreinado. O reflexo de nadar é bastante conhecido e foi publicado pela Dra.Myrtha McGraw em seu artigo "Comportamento de Nadar do Recém Nascido Humano" em 1939 (6). O reflexo de mergulhar é menos conhecido porém bem mais relevante para a teoria do primata aquático e natação dos bebês. Quando um bebê, com idade inferior a 12 meses é submergido, um reflexo impede que a água entre em seus pulmães e o reflexo do mergulho diminui a frequência cardíaca e a pressão sanguínea (Tabela). Isso diminui nos primeiros 12 meses de vida porém pode ser retreinado posteriormente.


Bradicardia ANTES DEPOIS
PINGUIM 200 20
LEÃO MARINHO 95 20
BELUGA 100 16
HOMEM 72 35

Tabela. Batimentos cardíacos antes e depois de submergir


A NATAÇÃO PARA BEBÊS

Se é verdade que tivemos um passado aquático, então pareceria normal o fenômeno da natação infantil. Se não tivemos um passado aquático, então as características que o homem exibe, gordura subcutânea, postura ereta mais esguia, reflexos de nadar e mergulhar, controle do fôlego e palmas das mãos achatadas, indicaria uma vez mais que o habitat natural infantil seria nadando debaixo da água. Em 1960, quando Hardy (4) primeiro apresentou sua teoria, algumas pessoas não puderam aceitar a possibilidade de primatas aquáticos por considerarem o ambiente aquático muito hostil para primatas recém-nascidos. Anos se passariam até que estes aprendessem a nadar. Esta peça de sabedoria popular todavia foi totalmente alterada nos anos seguintes. Descobriu-se que bebês humanos são capazes de nadar não somente antes de andarem, porém, antes mesmo de engatinharem. O erro cometido no passado foi de não introduzir à água cedo demais e sim atrasar esta introdução em demasia.

Naquelas civilizações que contavam com o benefício de águas mornas tropicais, natação de bebês era parte natural da vida. Quando o capitão Cook descobriu as Ilhas Havaianas registrou no diário de bordo o fenômeno dos neonatos flutuando de costas, nas enseadas e riachos mornos. Os índios Yokut da California também tem registros de natação de bebês.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Teoria do Primata Aquático deixa claro para mim o motivo dos bebês ficarem tão a vontade debaixo da água. Sociedades aquáticas primitivas tem nos mostrado a harmonia na qual vivem seus bebês na água. Estes crescem dentro e debaixo da água, tornando a água parte integrante de seu mundo. A criança cresce compreendendo as proppriedades da água bem como as próprias limitações. Se temos estes dons aquáticos, então por que não introduzimos nossos bebês a este meio ambiente aquático desde muito cedo e dar a oportunidade de crescerem em harmonia com a água? (7)

Seria negligente de nossa parte não darmos algum crédito à teoria aquática e a aceitação da natação de bebês como algo mais que um fenômeno como cremos hoje. Se praticada de maneira regular (pelo menos uma vez por semana) uma criança cresceria com afinidade com a água e respeito pelas propriedades dessa água bem como suas próprias limitações.

(1) Wikipedia [Internet]. Hong Kong: Bert Wang-Chak Chan; 2013 Oct 31. File:Human Aquatic Adaptations.png; [cited 2022 Jan 9]; Available from: https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Human_Aquatic_Adaptations.png

(2) Morgan E. The Aquatic Ape. New York: Stein and Day; 1982.

(3) Morris D. The Naked Ape. New York: Dell Publishing; 1984.

(4) Hardy A. Was More Aquatic In The Past?. The New Scientist. 1960 Apr;7:642-645.

(5) Jones F W. Man‘s Place Among The Mammals. London: Edward Arnold; 1960.

(6) Mc Graw M. Swimming Behavior of the Human Infant. Journal of Pediatrics. 1939;15:485-490.

(7) Kochen C L, McCabe J. The Baby Swim book. lllinois: Leisure Press; 1986.


Estatísticas do Artigo

Stats

 


Apoio

Apoie a NADAR! Envie uma mensagem agora, para: NADAR@REVISTANADAR.COM

Bookstore