Artigo - Sugestões de exercícios de reabilitação para lesões em nadadores


Capa desta edição, Bruno Fratus que lutou 2 anos contra uma lesão no ombro, antes das olimpíadas Rio 2016

Capa: Capa desta edição, Bruno Fratus que lutou 2 anos contra uma lesão no ombro, antes das olimpíadas Rio 2016


Sugestões de exercícios de reabilitação para lesões em nadadores

Paulo Franco Rosa Nadar!
Lúcio Franco Rosa Nadar!

https://n2t.net/ark:/21207/NADAR.v1i164.3

Entendendo que as lesões em nadadores ainda representam um desafio aos estudos epidemiológicos, esta breve revisão, foca de maneira acurada numa visão geral das principais lesões em nadadores e apresenta sugestões de estratégias de tratamento e exercícios para prevenção e reabilitação das mesmas.

Palavras-chave: Ombro de nadador, prevenção de lesões, manguito rotador, reabilitação, joelho do peitista

INTRODUÇÃO

            A natação é tradicionalmente conhecida como atividade física completa e que atende a tratamento de lesões, recuperação de atletas machucados, meio de superação de estresse. Entretanto, quem nada diariamente de quatro a oito quilômetros, como fazem atletas de natação, conhece o outro lado da natação. Quem já não ouviu falar na síndrome do ombro do nadador e outras ameaças ao sucesso na carreira destes atletas?

            Para compreender os mecanismos que levam os atletas da natação a sofrer lesões desportivas, se requer algum conhecimento da anatomia do movimento do corpo humano. Genericamente, as lesões encontradas em nadadores são resultados do excesso de repetição de determinados movimentos. De acordo com Brian J. Tovin, do The Sports Rehabilitation Center, Atlanta, Geórgia, 'um nadador competitivo normalmente ultrapassa 4.000 braçadas em um ombro em um único treino, tornando esse esporte uma fonte comum de patologias para esta região do corpo'. (1) Elas se originam de falhas técnicas, o que nos obriga a avaliar constantemente a biomecânica dos nadadores em treinamento para futuras precauções. Segundo McMaster (2), do departamento de cirurgia ortopédica da Universidade da Califórnia/EUA, em trabalho publicado na revista Sports Medicine, ‘as atividades natatórias apresentam baixo potencial de lesionar os praticantes’. Entretanto, o médico alerta para os riscos: ‘é importante analisar o treino do atleta em sua totalidade, identificando fatores como carga de treinamento e programa fora d’água’. Já com relação aos não-atletas ou nadadores masters, surge o risco dos fatores relacionados à idade ou inabilidade técnica, que não estarão tão presentes nos jovens nadadores ou atletas.


A articulação do ombro e suas estruturas periarticulares

Figura 1: A articulação do ombro e suas estruturas periarticulares (3)


ANATOMIA DO MOVIMENTO

Como já foi dito, nadadores competitivos repetem movimentos excessivamente. Assim, as áreas formadas por articulações móveis no corpo humano são as passíveis de maiores sofrimentos, ao nadador, particularmente os ombros e joelhos. Não menos problemáticas, também são as áreas do pescoço e costas.

As articulações móveis, que podem sofrer desgastes devido ao excesso de uso devem ser entendidas. Seus principais elementos são as articulações em si, os ligamentos e tendões (Figura 1). Articulação é a conexão entre dois ossos contíguos (vizinhos, adjacentes). Sua estrutura é muito variada e dela depende o grau de movimento que ambos os ossos podem realizar. A articulação pode permitir movimentos limitados ou de intensidade variável. Quando a união é feita por fibrocartilagem, o movimento é limitado, é o caso das vértebras. Já no caso do joelho e ombros, por exemplo, os ossos são munidos de uma camada de cartilagem sobre suas superfícies articulares e separadas por uma cavidade articular. Uma série de ligamentos impedem que se desviem de suas posições de relação. A amplitude dos movimentos depende das extremidades articulares dos ossos e da disposição dos ligamentos. A cavidade articular é recoberta pela membrana sinovial, cujas células segregam um líquido que enche a cavidade e lubrifica as superfícies em contato. As cartilagens articulares e o líquido sinovial fazem que o atrito dos ossos ao se moverem, seja mínimo. Os ligamentos são massas de tecido conjuntivo em que as fibras de colágeno estão muito reforçadas e formam feixes muito consistentes, dispostos segundo as linhas de maior tensão mecânica. Geralmente se estendem de um osso ao outro de ambos os lados das articulações. Os tendões são faixas de tecido conjuntivo que fazem a ligação entre os músculos e podem inclusive penetrar no osso em sua parte mais dura.

IDENTIFICAR ATLETAS EM RISCO

Um diagnóstico preciso possibilita o tratamento adequado visando o retorno do nadador à água. Técnico e atleta devem discutir os problemas em conjunto para que sejam tomadas medidas preventivas durante o treinamento. ‘O monitoramento cuidadoso do volume, intensidade e duração do treinamento por treinadores e médicos irá minimizar as lesões por uso excessivo e identificar os atletas em risco', observa Rodeo (4), citado por Wanivenhaus et al. (5). No caso do relato de dores, uma história detalhada deve ser obtida a fim de determinar o início, a duração e o movimento específico, relacionado à dor. O nadador deve ser abordado sistematicamente para um check-up. Inspeção e avaliação do alcance do movimento de força e do laceamento das articulações ajudam no diagnóstico do problema.


Exercícios de reabilitação e fortalecimento para nadadores

Figura 2: Exercícios de reabilitação e fortalecimento para nadadores (8)


O CLÁSSICO “OMBRO DO NADADOR”

O termo 'ombro do nadador' não é novo, ele foi introduzido lá no idos de 1974 por Kennedy e Hawkins (6) para descrever uma condição comum entre nadadores competitivos, caracterizada por dor e disfunção do complexo do ombro. (7)

De acordo com McMaster, 'o ombro do nadador não é uma entidade definível por si só, o problema da dor no ombro em atletas de natação advém de uma multiplicidade de fatores. O ombro é uma área de referência de dores vindas de diversas estruturas adjacentes'.

            Conforme explicado por Jimenez, citado por Rosa (8):

A articulação do ombro é uma estrutura instável. A função de estabilização da articulação é feita por ligamentos articulares e músculos. A artrite na articulação escápula-umeral ocorre quando há um parcial estiramento dessa musculatura, criando um arranjo do encaixe articular e um desgaste da superfície da articulação. Tudo isso está associado ao excesso de utilização da articulação pelo nadador.

Os microtraumas podem ocorrer quando a articulação do ombro é submetida a repetitivos estímulos, já que a maior parte da propulsão em natação vem dos braços. Também foram observadas alterações no ângulo das estruturas articulares dos nadadores. Em alguns, essas alterações não causam problemas, em outros isso requer uma força adicional para manter a estabilidade da articulação. Essa nova situação acarreta fadiga e inflamação, ou até mesmo dor, subluxação ou deslocamento.

Para prevenir ou reabilitar a síndrome do ombro do nadador recorremos às pesquisas de Kenal e Knapp (9). Para elas, a mecânica dos nados deve ser revista. Cruzar as mãos na frente ou manter uma posição nivelada ao invés de rotacionar o corpo promove a limitação mecânica do ombro, quando na fase interna extrema da rotação. Nadadores que respiram constantemente do mesmo lado devem ser encorajados a fazer respiração bilateral nos treinos. Outros movimentos, como empurrar a parede da piscina para dar impulso, ao usar a pranchinha de natação também não se aconselha por ocasionar limitação mecânica ao ombro.

Para quem já foi vitimado pelo ombro do nadador, recomendaremos três exercícios de reabilitação sugeridos por Kenal e Knapp (9). Os exercícios visam fortalecer a musculatura interna do ombro e áreas adjacentes (rombóides, trapézio). O 'pulley recíproco' (Figura 2), consiste num cabo com segurador nas duas pontas, rosqueado através de um pequeno pulley. O paciente segura um lado com a mão referente ao ombro doente(no caso da nossa figura, o lado direito), enquanto move o braço oposto numa rotação para fora.

Outro interessante exercício que ajuda no fortalecimento e estabilização da musculatura dessas áreas é o 'supino alfabeto' (Figura 2). O paciente deita numa prancha inclinada e com o ombro flexionado a 90 graus e cotovelo estendido, ele desenha o alfabeto com um peso de mão (cerca de dois quilos). Com o auxílio do pulley preso ao pulso pode-se adicionar resistência ao exercício. Mais uma dica das pesquisadoras de Utah: 'isométrico e isotônico' (Figura 2). O paciente segura o braço preso ao pulley isometricamente em rotação para fora, enquanto a escápula é retraída isotonicamente.

O “JOELHO DO PEITISTA”

Nos nadadores de peito é muito comum lesão nos joelhos. O problema ocorre na iniciação da pernada, fruto do alinhamento do centro do joelho em relação ao centro do quadril. Ocorre o desenvolvimento de estresse no ligamento medial e na cápsula articular. Excedendo o alcance elástico do ligamento, poderá ocorrer rompimento do mesmo. Nadadores de elite também tem problemas na musculatura adutora como resultado do tipo de contração e a conseqüente tensão mantida pelo músculo. Ainda nesta área, o menisco, uma estrutura de fibrocartilagem, também pode ser lesionada, com a combinação de movimentos de flexão lateral e torsão (no nado de peito). Nestes casos a melhor forma de prevenir os problemas é com a melhora da técnica do movimento e com um apropriado volume de treinamento, que não sobrecarregue os joelhos.

A incidência do joelho do peitista em quase 80% dos atletas pesquisados por catedráticos da Universidade Católica de Murcia foi verificada em nadadores competitivos de diversos níveis. De acordo com essa pesquisa (10), a causa do problema é, como sempre, o excesso de repetição de determinado movimento, neste caso um tipo de flexão forçada dos joelhos utilizada no nado de peito. Segundo estudos, o atleta começará a reclamar de dor durante a fase propulsiva da pernada, na qual se passa de uma posição de flexão, abdução e rotação interna do quadril com o joelho flexionado e em rotação externa a uma posição de extensão total, durante a fase de propulsão.

Para a reabilitação dos joelhos, vamos recorrer às pesquisadoras de Utah/EUA (9), mais uma vez, que vão recomendar o fortalecimento da musculatura dos quadris e das pernas em bicicleta e no aparelho de leg press. Enquanto para os ombros machucados não se recomenda exercícios de alongamento, para a região das pernas eles são importantes após as séries de musculação, como o alongamento do flexor do quadril (Figura 2).

AI...QUE DOR NAS COSTAS

Atletas em geral, submetidos a qualquer atividade extenuante precisam fortalecer sua região lombar ou as dores aparecerão. Costas e pernas pouco flexíveis e músculos desta região fracos são os fatores responsáveis por futuros problemas. Qualquer exercício que use as extremidades e requeira forças de estabilização do tronco pode ser empregado como o exercício de ‘estabilidade e força nas costas’ (Figura 2).

Na posição de quadrúpede, o paciente primeiro eleva um braço e depois a perna oposta. Quando isto puder ser realizado sem excessiva rotação do tronco, o paciente poderá progredir para a etapa seguinte, elevando braço e perna simultaneamente. Numa etapa avançada, o paciente poderá realizar o mesmo exercício efetuando paradas com braços e pernas no ar ou até mesmo fixando pesos nas extremidades (punho e canela).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muitos estudos examinaram o efeito da síndrome do ombro e outras ameaças ao sucesso profissional de nadadores competitivos. Esta revisão apresentou um panorama geral que merece ser aprofundado, abordando a epidemiologia, ou seja, distribuição, fatores determinantes de agravos, agravos à saúde e, por fim, uma proposição de medidas específicas para prevenir, controlar ou erradicar os agravos. (5,11,12)

Villanueva et al. (10), em seu estudo junto aos peitistas, avisam que a prevenção é a primeira medida a tomar e inclui: a) execução correta da técnica do nado; b) alongamentos; c) musculação; d) detecção precoce da fadiga; e e) crioterapia preventiva durante as competições. O tratamento da patologia deverá prever: a) alongamentos; b) correção técnica do nado; c) repouso ativo, isolando a área afetada com polibóias; d) musculação; e) crioterapia; f) aplicação de ultrasom e g) estimulação nervosa elétrica transcutânea.

McMaster (2), explica que a maioria das lesões e enfermidades encontradas em atletas da natação são resultantes do excesso de repetições, e sua administração bem sucedida não requer, usualmente, uma intervenção cirúrgica. Descanso e outras medidas para reduzir a inflamação devem ser tentadas. “É importante entender que, enquanto em descanso ou treinando menos, todo esforço para manter o atleta na água deve ser feito, já que a cessação dos treinos encaminha para um rápido processo de perda de performance”, finaliza o médico.

REFERÊNCIAS

(1) Tovin BJ. Prevention and Treatment of Swimmer‘s Shoulder. N Am J Sports Phys Ther [Internet]. 2006 November [cited 2021 Oct 8];1(4):166-175. PMID: 21522219. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC2953356/ .

(2) McMaster WC. Shoulder Injuries in Competitive Swimmers. Clin Sports Med. 1999 April;18(2):349-359.

(3) Tipo acromial de brasileiros: Estudo em escápulas humanas - Scientific Figure on ResearchGate. Available from: https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-Articulacao-do-ombro-e-suas-estruturas-periarticulares_fig2_340044467 [accessed 16 Oct, 2021].

(4) Rodeo SA. Swimming. In: Krishnan SG, Hawkins RJ, Warren RF, eds. The Shoulder and the Overhead Athlete. Philadelphia, PA: Lippincott, Williams & Wilkins; 2004:350

(5) Wanivenhaus F, Fox AJS, Chaudhury S, Rodeo SA. Epidemiology of Injuries and Prevention Strategies in Competitive Swimmers. Sports Health [Internet]. 2012 May [cited 2021 Oct 8];4(3):246-251. Available from: https://journals.sagepub.com/doi/10.1177/1941738112442132

(6) Trinidad A, González-Garcia H, López-Valenciano A. An Updated Review of the Epidemiology of Swimming Injuries. PM&R [Internet]. 2020 October [cited 2021 Oct 21];13(9):1005-1020. Available from: https://doi.org/10.1002/pmrj.12503

(7) Kennedy J C, Hawkins R J. Swimmer‘s shoulder. Phys Sports Med. 1974;2:35-38.

(8) Rosa PF. O ombro do nadador e outras histórias. Nadar Rev Bras Esp Aquat. 2006;:37-41.

(9) Kenal KAF, Knapp LD. Rehabilitation of Injuries in Competitive Swimmers. Sports Med. 1996 Nov;22(5):337-347.

(10) Villanueva ZV, Páez LC, Pardo EM, Soler CN. Rodilla del bracista: assessment of the incidence and proposal of physical therapy intervention in competitive swimmers. EF Deportes [Internet]. 2005 Oct [cited 2021 Oct 8];10(89) Available from: https://www.efdeportes.com/efd89/rodilla.htm

(11) Gaunt T, Maffulli N. Soothing suffering swimmers: a systematic review of the epidemiology, diagnosis, treatment and rehabilitation of musculoskeletal injuries in competitive swimmers. British Medical Bulletin [Internet]. 2012 September [cited 2021 Oct 21];103(1):45-88. Available from: https://doi.org/10.1093/bmb/ldr039

(12) Tessaro M, Granzotto G, Poser A, Plebani G, Rossi A. SHOULDER PAIN IN COMPETITIVE TEENAGE SWIMMERS AND IT‘S PREVENTION: A RETROSPECTIVE EPIDEMIOLOGICAL CROSS SECTIONAL STUDY OF PREVALENCE. Int J Sports Phys Ther [Internet]. 2017 Oct [cited 2021 Oct 21];5(12):798-811. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC5685406/ .


Estatísticas do Artigo

Stats

 


Apoio

Apoie a NADAR! Envie uma mensagem agora, para: NADAR@REVISTANADAR.COM

Bookstore