Versão Digital - Proposta Metodológica para o Ensino do Nado Borboleta segundo a visão do Construtivismo
Versão impressa original em: Freitas M R. Ensinando o golfinho. Nadar Rev Bras Esp Aquat 1997; 113:19-21.
Figura. Nado Borboleta. (1)
Proposta Metodológica para o Ensino do Nado Borboleta segundo a visão do Construtivismo
Moacyr Freitas*
*Professor de Educação Física, Técnico em Treinamento Desportivo, Árbitro de Natação e Consultor Editorial de NADAR! SWIMMING MAGAZINE
Palavras-chave: nado borboleta, buterfly, golfinho, construtivismo, aprendizagem do nado
https://n2t.net/ark:/21207/NADAR.v1i164.7
RESUMO
O presente trabalho apresenta a análise técnica do nado borboleta, o estudo da aprendizagem e suas aplicações motoras e os métodos de ensino à Educação Física e consequentemente à natação. Aqui o construtivismo, como "tendência" educacional, vem provar sua eficiência pedagógica, como elemento facilitador do processo ensino -aprendizagem para o nado borboleta.
INTRODUÇÃO
Das quatro técnicas de nado utilizadas na natação competitiva - Crawl, Costas, Peito e Borboleta; o nado Borboleta é o que mais chama a atenção por suas técnicas na fase de aprendizagem.
Quando acompanhamos uma competição de natação, as provas do nado borboleta se destacam. Quando, durante os Jogos Olímpicos, a televisão faz a "chamada" para as provas de natação, a imagem é a do nado borboleta. Quando se anuncia algum produto, cuja imagem venha acompanhada ou associada à natação, esta imagem é a do nado borboleta, procurando provar o alto valor de energia do produto (Figura).
Com a grande influência que os meios de comunicação exercem, evidentemente, a vontade de nadar o borboleta é muito grande. Clubes, academias, centros esportivos estaduais e municipais e outras entidades possuem cursos e programas de natação para todos os níveis - da adaptação ao meio líquido à competição. Porém, apesar de toda esta estrutura, os profissionais que trabalham na fase de aperfeiçoamento enfrentam grande dificuldade no momento de ensinar o nado borboleta. Mas, qual é a dificuldade? A coordenação? O trabalho dos braços? A pernada golfinhada? O medo de se ensinar o nado para crianças?
A verdade é que estas questões se baseiam unicamente na falta de informação.
A proposta metodológica para o ensino do nado borboleta segundo a visão do construtivismo leva em conta que, para chegar a esse estágio, o aluno passou por processos de aprendizagem (e muita prática) em adaptação ao meio líquido, deslize e deslocamentos variados, movimentos de pernas e braços até chegar ao aprendizado, e consequente aperfeiçoamento (aprendizado mais refinado), das técnicas dos nados crawl e costas; em que habilidades como técnicas de pernada, braçada, respiração, coordenação, saídas, viradas e chegadas são constituídas por componentes complexos e, por esta razão, proporcionam grande bagagem de conhecimento.
Após uma profunda análise técnica, baseada nas regras oficiais, passando pelo estudo da aprendizagem, enquanto fator preponderante para a formação do indivíduo, e pelo estudo dos métodos de ensino aplicados à natação, propõe-se uma metodologia, enquanto instrumento facilitador do processo ensino-aprendizagem, para o nado borboleta.
Quanto ao construtivismo, que por si se constitui em um grande objeto de estudo, utiliza-se sua essência; ou seja, ter em mente que o aluno traz consigo uma série de informações, experiências e vivências histórico-sociais e motoras que devem ser aproveitadas (e não desprezadas ou ignoradas) no processo de aprendizagem de uma habilidade motora.
NADO BORBOLETA
O nado borboleta deriva do nado peito. Segundo Espinosa (2), o nado borboleta surgiu durante uma competição de natação na piscina da ACM do Brooklyn Central de New York em dezembro de 1933. Henry Myers, por não conseguir realizar a braçada submersa do nado peito, resolveu recuperar seus braços por cima da água, de trás para a frente, mantendo, porém, o movimento normal das pernas do nado peito. O nado apresentado por Myers lembrava o voo de uma borboleta.
Para a análise técnica do nado borboleta é interessante a classificação utilizada por Costil, Maglischo e Richardson (3).
Os autores dividiram o nado em 5 partes distintas: 1. Ação dos braços; 2. Pernada golfinhada; 3. Coordenação; 4. Posição do corpo; 5. Respiração.
APRENDIZAGEM
Segundo HIDD (4), a 'Aprendizagem é o processo através do qual se dá uma mudança no comportamento por meio da prática e / ou experiência'. A área de aprendizagem motora busca explicar o que acontece internamente com o ser humano, bem como investiga os mecanismos (e suas variáveis) responsáveis pela mudança do comportamento motor.
O processo de aprendizagem motora acontece devido a uma sucessão de estímulos: a) estabelecer um objetivo (solução de um problema motor: estímulo externo); b) procurar a melhor maneira de alcançar o objetivo (processamento de informações do ambiente e do próprio corpo); c) selecionar um plano motor para a execução do movimento (de acordo com o estímulo externo); d) durante o movimento, receber informações de como o movimento está sendo executado; e) após o movimento, receber informações de como executou o movimento e, se o objetivo foi alcançado ou não (feedback).
MÉTODOS DE ENSINO
Quando se decide ensinar qualquer habilidade motora deve-se tomar uma decisão quanto ao método de ensino adequado, ou seja, como os alunos aprenderão melhor? No todo ou em partes?
Os métodos de ensino em Educação Física são: Global, Parcial e Misto. No método global o movimento é demonstrado por inteiro, do início ao fim. No método parcial defende-se a ideia de que a parte é mais importante que o todo. O método misto é uma interação entre os métodos global e parcial.
CONSTRUTIVISMO
Mencionando a contribuição de Ausebel para o pensamento construtivista, Carretero (5) diz:
'O conhecimento que se transmite, em qualquer situação de aprendizagem, deve estar estruturado não só em si mesmo, mas levando em consideração o conhecimento que o aluno já possui'.
A aprendizagem é um processo construtivo interno. O fato de se transmitir uma informação não é suficiente para que o indivíduo aprenda; é necessário que seja construída através da experiência interna. Então, pode-se dizer que o aprendizado é interno e que as experiências são individuais.
Quando uma informação é transmitida, esta causa um desequilíbrio interno no indivíduo e a sua ideia sobre o que era a informação (assunto, tema, etc.) passa por uma instabilidade. Uma das propostas do construtivismo é, justamente, criar conflitos cognitivos.
A SEI/CENP (6) entende que o construtivismo, na Educação Física, ocorre à medida e que o educador passa a assumir as seguintes posturas: a) preocupar-se com o crescimento do ser humano de dentro para fora, e não de fora para dentro; b) preocupar-se em conhecer e compreender o indivíduo como ele é, e não conceber a possibilidade de preparar o homem ideal; c) considerar o homem como um ser total, indivisível, e não acreditar no homem como um organismo passivo, manipulável e treinável.
PROPOSTA METODOLÓGICA PARA ENSINAR BORBOLETA
Esta proposta metodológica tem por finalidade oferecer aos profissionais da natação um novo conceito na aprendizagem do nado borboleta, tornando-a mais atrativa ao aluno e servindo de reflexão quanto à maneira "mecanicista" utilizada até agora.
O objetivo é a aprendizagem do nado borboleta. A parte técnica mais apurada, o refinamento do gesto motor de cada fundamento, ou seja, o aperfeiçoamento do nado, serão realizados na fase seguinte, de acordo com a estrutura de ensino adotada por cada instituição. Para cada aula, é estabelecido o objetivo a ser atingido e o método a ser utilizado. Sempre, no início e no final da parte principal, nadar o borboleta completo, utilizando o fundamento aprendido.
Para cada fundamento a ser ensinado, o professor lança um desafio, uma dúvida, algo que desperte um "conflito" cognitivo, uma dificuldade para o aluno transformar em ação e, posteriormente, no gesto motor adequado e apropriado ao nado. "Quem sabe...? , "Quem consegue...?" "Duvido que alguém consiga fazer..." , "Quem pode mostrar...?" , " Faça para que seus colegas vejam!", "E se você fizesse,.. deste jeito?", "Será que alguém sabe fazer diferente?" devem estar sempre presentes em cada exercício!
A proposta construtivista é fazer com que o aluno execute várias vezes o gesto, não com a intenção de automatizar, mas com o sentido da descoberta, da pesquisa, da investigação dos movimentos/gestos que compõem o nado, na sua totalidade e/ ou nas partes. Exercitar tendo como desafio saber fazer, de fazer melhor, para superar limites!
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conclui-se, pelo exposto neste estudo, que a aprendizagem é um processo que ocorre internamente no ser humano, resultante da prática e/ ou experiência anterior. Não é observável. Já o desempenho, é observável e ocorre através das respostas emitidas pelo indivíduo, sobre o que lhe foi ensinado.
A determinação de experiências anteriores é fundamental para o planejamento do processo de aprendizagem. Como as experiências anteriores não se limitam ao momento, mas servem de ponto de partida para novas situações de aprendizagem, a aprendizagem do movimento requer atitudes como prática, tentativas, tomadas de decisões, avaliações; ou seja, a aprendizagem do movimento surge através do movimento.
O método misto é o mais indicado para o ensino do nado borboleta.
O construtivismo, como "tendência" pedagógica, leva em conta o conhecimento que o aluno já possui sobre o que lhe vai ser ensinado. A aprendizagem deve ser significativa, pois o aluno deverá compreender e entender o que está sendo transmitido pelo professor para poder aprender.
Finalizando, a aprendizagem é uma mudança interna do indivíduo, observável através de seu desempenho, cabendo ao professor avaliar se a habilidade foi, ou não aprendida. O método misto é o mais indicado em função das experiências anteriores que determinam o planejamento do processo ensino - aprendizagem.
REFERÊNCIAS
(1) Freepik [Internet]. Málaga: People photo created by drobotdean; 2022. Free Photo : Male swimmer swimming the butterfly stroke; [cited 2022 Jan 7]; Available from: https://www.freepik.com/photos/people
(2) Espinoza E A. 100 metros livre: Uma disputa através do tempo. Nadar Rev Bras Esp Aquat 1996; 98:19-22.
(3) Costill D L, Maglischo E W, Richardson A B. Natacion. Barcelona: Hispano Europea; 1994.
(4) Hidd F S. Método de ensino parcial e método de ensino das partes progressivas na aprendizagem do nado crawl [Dissertação de mestrado]. São Paulo: USP; 1991.
(5) Carretero M. Construtivismo e educação. Porto Alegre: Artes Médicas; 1997.
(6) Projeto Ipê, editor. A criança e o conhecimento: Retomando a proposta pedagógica do ciclo básico; 1990. São Paulo: SEI CENP; 1990.
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XAVIER, T. P. Métodos de ensino em educação física. Ed. Manole, São Paulo, 1986.
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